Os Amores de Safo, de Erica JONG (tradução de Maria José Santos), BERTRAND EDITORA, 2004
Verdade histórica, verosimilhança ou imaginação delirante? Ou, talvez, de tudo um pouco… Em todo o caso, estamos perante um agradável exercício de probabilidades… Safo, a mítica poetisa da belíssima Ilha de Lesbos, terá viajado pelo Mar Egeu e pelo Mar Mediterrânico, terá sido hóspede das terríveis Amazonas e terá mesmo encontrado Orfeu numa visita à Terra dos Mortos, o que só por si a coloca ao nível do heróico Ulisses. A contadora desta história com mais de 2600 anos e que se pretende uma viagem aos “lugares mais recônditos da mente da poeta que cantou o amor de forma inigualável” (conforme se pode ler na contracapa do livro), não poupa Safo aos mais elogiosos actos de heroicidade, coragem e inteligência. Já nas questões relacionadas com a orientação sexual da nossa rapsoda a autora não é tão eloquente. Um pouco presa ao politicamente correcto (não esqueçamos que a autora é norte-americana) parece algo preocupada em mostrar que a bissexualidade de Safo terá mais que ver com o facto de não lhe ter sido possível viver em pleno o seu grande amor, a paixão de toda a sua vida pelo poeta Alceu. E nós, pobres ignorantes, a acreditarmos que ela era lésbica não apenas por ter nascido na Ilha de Lesbos… O livro passa, de certa forma, a imagem de que as mulheres se relacionam entre si acima de tudo por diversão, distracção ou como forma de satisfazer impulsos sexuais sem ter de recorrer aos homens e sem ter de levantar a questão da contracepção. Triste e redutora forma de abordar a homossexualidade de quem tão sensualmente cantou o amor entre mulheres, mas adiante… Haverá nisto fundamento histórico ou transparece apenas uma abordagem verdadeira e/ou inconscientemente homofóbica em que a narrativa contradiz, por vezes, a teoria inicial de que o amor não terá sexo? Cabe a cada leitor investigar, reflectir e avaliar. Que este reparo crítico não invalide, porém, o prazer que tiramos de uma escrita linear, por vezes surpreendente, sempre muito agradável que nós agarra e conduz ao longo das mais de 300 páginas de narrativa das aventuras e desventuras da nossa Safo, completadas pela inclusão de alguns fragmentos de textos seus e, no final, por nove poemas que a autora escreve sob influência da bela poetisa. Tudo isto numa tradução honesta e clara a conseguir manter toda a qualidade poética da prosa de E. Jong. A valer alguma reflexão sem se perder uma boa leitura, nesta humilde opinião. (texto publicado originalmente no boletim do Clube safo, Zona Livre, em Janeiro de 2005) |
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