APENASEU

Wednesday, May 23, 2007

Da minha estante VIII

" Ecce homo, parece dizer cada poema. Eis o homem, eis o seu efémero rosto feito de milhares de rostos (...) "
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Eugénio de Andrade (1923-2005)
EROS THANATOS
1.
Ó pureza apaixonadamente minha:
terra toda nas minhas mãos acesa.

2.
O que sei de ti foi só o vento
a passar nos mastros do verão.

3.
Um corpo apenas, barco ou rosa,
rumoroso de abelhas ou de espuma.

4.
Entre lábios e lábios não sabia
se cantava ou nevava ou ardia.

5.
Amo como as espadas brilham
no ardor indizível do dia.

6.
Seria a morte esta carícia
onde o desejo era só brisa?


DESPEDIDA

Colhe
Todo o oiro do dia
Na haste mais alta
Da melancolia.

(Ostinato Rigore, 1964)

Wednesday, May 16, 2007

A tod@s as vítimas de todas as Homofobias


“Malhas que o Império tece
Jaz morto e apodrece
O menino de sua mãe”
Fernando Pessoa



Jaz mort@ e apodrece



Talvez tenha nascido, sorrindo
Menino de sua mãe
Enganada porém
Nem corpo nem alma
Nem sensação
Nenhuma porta ao estender da mão.
A vida
Atirou a primeira pedra
E o espelho devolveu
A imagem errada:
Ilusão de homem,
Sangue doce de Mulher…

Voou, foi nuvem
Sonhou, mais além
O mundo em aplauso,
Acreditou … era seu
De novo o que os anjos guardam.
Mas cedo demais,
Espinhos feriram o caminho
Ao longe, esqueceram a prece
No medo, a lembrança esquece
E vieram os perdidos
Mais perdidos que a perdida
(porque a fome não conhece perdão).

Jaz mort@ e agora arrefece
Apodrece em paz,
Puro
O coração.


© Reservados os direitos de autor
Foto: Reprodução de quadro a óleo "Gisberta" de Vicente Andréu
(quadro à venda: http://www.panterasrosa.blogspot.com/) .

Tuesday, May 08, 2007

HOMO

*
Fez de mim um homem.
A tropa
O sangue
No muro das guerras
Amargo
Fez de mim
A dor
No fundo da ferida
A falta,
O abraço ausente
O fogo
Sem armas
E as lágrimas.
Fez de mim um homem
O homem que não fui,
Aquele que nunca sou.
*
© Reservados os direitos de autor
Foto: Pascal Renoux

Wednesday, May 02, 2007

Resistência




Passarás por mim
De todas as vezes
Que a distância do olhar for vencida
E o medo exilado nas sombras.

Sempre que eu falar de amor ou de terra
Os lábios calarão o teu nome
Mas um brilho de fósforo nos meus olhos
Revelará aos mais atentos o animal
Preso para sempre dentro do meu corpo.

O desejo pronto e atento,
Emboscado nesta espera.

© Reservados os direitos de autor
Foto: Pascal Renoux